segunda-feira, 14 de setembro de 2009

L'Amour Est un Oiseau Rebelle

L'Amour est un oiseau rebelle

Que nul ne peut apprivoiser

Et c'est bien en vain qu'on l'appelle,

S'il lui convient de refuser.


Rien n'y fait, menace ou prière,

L'un parle bien, l'autre se tait;

Et c'est l'autre que je préfère

Il n'a rien dit; mais il me tient.


L'Amour est un oiseau rebelle

L'Amour

Que nul ne peut apprivoiser

L'Amour

Et c'est bien en vain qu'on l'appelle

L'Amour

S'il lui convient de refuser

L'Amour


L'Amour est enfant de Bohême,

Il n'a jamais, jamais connu de loi,

Si tu ne m'aime pas, je t'aime,

Si je t'aime, prend garde à toi!

(Prends garde à toi)

Si tu ne m'aime pas si tu ne m'aimes pas je t'aime

(Prends garde à toi)

Mais si je t'aime si je t'aime prends garde à toi!


quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Só para raros

Em decorrência da fetidez que assola o país, só tenho vontade de escrever textos sórdidos, coléricos, cínicos, degradantes ou estufados de um humor cruel (...), “censurado”, ou só para cínicos , ou “só para fazer sorrir os desesperados”, ou até quem sabe , à maneira de Hesse: “só para raros”. Porque convenhamos, há pulhas em demasia. E enquanto não se resolve isso (...) não consigo escrever nada de coerente e agradável (...). A cólera pode ser sanada através de um texto escuro e licencioso, mas diante de uma realidade tão acabrunhada (...) me vem um texto de G.R. Urban citando Bérgson: não são somente as palavras que se extenuam, racham e, às vezes, “quebram sob a carga”, mas idéias também sofrem tensão e se desintegram ante a inibidora presença das palavras.

Odes maiores ao pai

imagem
I

(Largo Pensante)

Uns ventos te guardaram. Outros guardaram-me a mim. E aparentemente separados
Guardamo-nos os dois, enquanto os homens no tempo se devoram.
Será lícito guardarmo-nos assim?
Pai, este é um tempo de espera. Ouço que é preciso esperar
Uns nítidos dragões de primavera, mas à minha porta eles viveram sempre,
Claros gigantes, líquida semente no meu pouco de terra.
Este é um tempo de silêncio. Tocam-te apenas. E no gesto
Te empobrecem de afeto. No gesto te consomem.

Tocaram-te nas tardes, assim como tocaste
Adolescente, a superfície parada de umas águas? Tens ainda nas mãos
A pequena raiz, a fibra delicada que a si se construía em solidão?
Pai, assim somos tocados sempre.
Este é um tempo de cegueira. Os homens não se vêem. Sob as vestes
Um suor invisível toma corpo e na morte nosso corpo de medo
É que florece.

Mortos nos vemos. Mortos amamos. E de olhos fechados
Uns espaços de luz rompem a treva. Meu pai: Este é um tempo de treva.

II

Ah, essas dores! E o voltar contínuo ao silêncio das tardes!
Junto ao muro dos mortos o passeio se fazia longo. Estacávamos.
A tarde embobrecia de luz. O tempo galopava.
Vês? Tenho a alma pesada. Uma avidez no olhar
Antes ingênua, agora se fez grave. Há naquele campo a imutável paisagem:
As papoulas abertas, as ruas estreitas e uma grande e única alameda.
E datas, retratos. E súbito o ocre da terra sob os passos.
A mulher caminhava. Comprimia no peito a sua flor e de humildade
Era o olhar à procura do nome. Se tu visses depois que luminosa altivez
Se insinuava, quando voltava leve, sem o peso das dádivas.
E muitas passaram vagarosas. Umas lunares, com seus rostos aduncos.
Outras com as centelhas escondida dos sacrários.


III

Não é teu este canto porque as palavras se abriram sobre a mesa.
Se chegavas era em silêncio e tocavas as coisas
Com a leveza dos meninos arminando os altares. Uma rosa tardia
Mesmo assim desmanchava-se e tua presença na noite eu procurava.
Ninguém jamais nos via quando nos falávamos. As perguntas de sempre,
Os castiçais, o adro vazio da capela em frente. E as persianas fechadas,
Para que sal de fora não pousasse
Nas baixelas incríveis da memória. Aquele mar repetindo seu canto
E as vozes partindo teus cristais! Como te abrigavas do ruído das estradas
E os teus livros abertos, como se desfizeram naquelas areias!
Nem sei de onde me vêm estes musgos, açoites, esta fonte que é nova
Em minha boca. Nem sei dizer da morte o que te ouvi dizer nos ecos de umas noites.

Enquanto te celebro, as janelas do ocaso trazem risos.
E um hóspede atravessou incógnito teu jardim, afundou-se na nevoa
Cansou-se do teu hálito nas arestas, nas muradas, nos cálices, em mim
És presente como um vento que corre entre portas abertas.


IV

Na tua ausência, na casa o perfume das igrejas. O odor
Da castidade antiga dos incensos, reacendeu a alegria da infância
E aspirei contigo o perfume menos casto das cerejas. Na casa,
Um ruído de contas de rosário, mas eu só, meu pai, te vigiava.
Os ventos te seguiram. E próxima do teu passo, eu mesma era silêncio
A pedra. Impossível de abraço.
Uma torre contigo caminhava. Nos muros, nas escadas, refizeram ardis
Fibras trançadas, e aqueles pareciam mais largos, aquelas mais altas.
No teu andar, um quase nada definido. Tinhas o caminhar dos animais.
Espaçado e perdido. Respirei teu mundo movediço: Pai, não viste o sal da terra
Corroendo os pilares, as cruzes, as capelas ? E o sonho sobre a tua fonte
E mesmo uma crisálida pronta para ter asas ?
Abriram-se os portões, mas a casa era nova. A que foi nossa.
Tuas filhas te disseram que na noite, um homem e sua torre,
Com paciência guardadas, pouco a pouco a demoliram.


V

Sobrevivi à morte sucessiva das coisas do teu quarto.
Vi pela primeira vez a inútil simetria dos tapetes e o azul diluído
Azul-branco das paredes. E uma fissura de um verde anoitecido
Na moldura de prata. E nela o meu retrato adolescente e gasto.
E as gavetas fechadas. Dentro delas aquele todo silencioso e raro
Como um barco de asas. Que fome de tocar-te nos papéis antigos!
Que amor se fez em mim, multiforme e calado!
Que faces infinitas eu amei para guardar teu rosto primitivo!
Desce da noite um torpor singular, água sob o casco de um velho veleiro
Calcinado. Em mim, o grande limbo de lamento, de dor, e o medo de esquecer-te
De soltar estas âncoras e depois florir sem ao menos guardar tua ressonância.
Abraça-me. Um quase nada de luz pousou na tua mesa
E expandiu-se na cor como um pequeno prisma.

VI

Há tanto a te dizer agora! Meus olhos se gastaram
Procurando a palavra nas figuras, nos textos, nas estórias.
Era preciso viajar e levantada em renúncias redescobrir a morte
Além de seu sudário e suas tremuras. Quase nada aprendi.
De nada me lembrei.
Há talvez a memória de tatos, um sentir rarefeito, um ouvido inexato
Deitado em solidão sobre o teu peito. E adeuses ingênuos, calados de vitória
E aquele de fereza, de acerto, dissolvido em orgulho, ressuscitado
Vagamente em canto. E na manhã, o meu sonho passara e a minha voz
Não se erguera em poesia.

Será preciso esquecer o contorno de umas formas que vi: naves, portais
E o grande crisântemo sobre a faixa restrita do canteiro.
Através do gradil, no terraço do tempo te percebo.

E ainda que as janelas se fechem, meu pai, é certo que amanhece.
(publicado junto à crônica acima em Cascos & Carícias & outras crônicas , 1993)