sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Eu que não sei quase nada do mar



Garimpeira da beleza
Te achei na beira de você me achar
Me agarra na cintura, me segura e jura que não vai soltar
E vem me bebendo toda, me deixando tonta de tanto prazer
Navegando nos meus seios, mar partindo ao meio
Não vou esquecer

Eu que não sei quase nada do mar
Descobri que não sei nada de mim

Clara, noite rara, nos levando além
da arrebentação
Já não tenho medo de saber quem somos
na escuridão

Me agarrei nos seus cabelos
Sua boca quente pra não me afogar
Tua língua correnteza lambe minhas pernas
Como faz o mar
E vem me bebendo toda, me deixando tonta de tanto prazer
Navegando nos meus seios, mar partindo ao meio
Não vou esquecer

Eu que não sei quase nada do mar
Descobri que não sei nada de mim

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Depois das loucuras simultâneas, Lacan se interessou pelos distúrbios da linguagem escrita ao apresentar ainda um caso de paranóia feminina . (...) Tratava-se de uma certa Marcelle, (...) que se considerava Joana d´Arc e queria regenerar a França. Ela julgava que seus escritos tinham um valor revolucionário : "Faço evoluir a língua", "é preciso sacudir todas essas velhas formas" (...). Eis uma amostra de seus escritos "inspirados":
Paris, aos 14 de maio de 1931. Sr. Presidente da República (...) em em vilegiatura nos pães-de-mel e nos trovadoces, Sr. Presidente da República invadida de zelo, Gostaria de tudo saber para vos fazer o mais camundongo logo poltrão e canhão de prova mas estou demasiado longe para adivinhar. Maldades que se fazem aos outros convém adivinhar que meus cinco gansos de Vals são descompostura e que sois o bobão da Santa Virgem e de perdão literário. Mas é preciso tudo reduzir da nomenclatura de Alvergne pois sem lavar as mãos em água de rocha se faz mijadura em leito seco e madalana é sem trair a putinha de todos esses de fresca barba por ser o melhor de suas oraies n a voz é doce e a pele fresca. Gostaria de ter amaldiçoado tougnate sem causar o prejuízo de vida plenária e sem custo se faz polícia judiciária. Mas é preciso espantar o mundo por ser o velhaco maldito de barbaranela e sem leito se faz tougnate.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Lázaro

Jesus olhou para o alto: eu sou a Ressureição e a Vida, o que crê em mim, ainda que esteja morto, viverá, e todo aquele que vive e crê em mim, não morrerá eternamente, crês nisso? Ela respondeu: sim, Senhor, eu creio que sois o Cristo, filho de Deus, que devia vir a este mundo.
(...)

Lázaro, porque me olhas tanto ? Porque és belo (...) Ele me segura pelos ombros: meu irmão... meu querido irmão... e me acaricia a fronte, os cabelos, a boca. Depois me abraça. Aturdido, beijo-lhe a face, os ombros, o peito. Até quando posso ficar contigo? Sempre ficarás comigo, Lázaro, porque crês em mim. Sim, mas até quando poderei tocar em Ti? Ele fecha os olhos, suas pálpebras escurecem: daqui há pouco, Lázaro, não nos veremos mais. Ajoelho-me, agarro-me aos seus pés, ouço a minha voz convulsionada : tenho medo, tenho medo de não agüentar o que resta sem a Tua presença. Quero estar sempre onde Tu estiveres, quero Te amar até morrer de novo, quero sentir tudo o que Tu sentires, compreendes? (...) E se for mais difícil do que tudo o que imaginas ? Mais difícil, irmão Jesus, é não ter toda a sua dor cravada em mim

(...).

Há um homem diferente no pátio. Vê-se que ele ama Jesus mais do que a si mesmo. O amor desse homem é diferente do meu amor : é um amor de mandíbulas cerradas, de olhar oblíquo, de desespero escuro. (...) Por favor, é preciso que me compreendam. Esse amor de Judas, o Iscariote, não é um amor ideal porque é ciumento e agressivo (...) e o olhar que lança ao redor é um olhar que diz : o meu amor é mais forte, é mais sangue, vocês não O possuirão.
(...)
eu acho que o amor de Iscariote tem que ser assim como é (...): eu te amo, e não sei se você compreende, Judas, o que significa quando uma pessoa, assim como eu, diz que te ama (...) Antes de minha morte eu tocava nas coisas, sim, tocava-as, mas não descobria o mais fundo (...) a sensação daquele toque não se fixava em mim. Mas se eu te tocasse agora (mas não quero) a tua carne sofreria aquela febre mais intensa, a febre viva e compassada, a minha febre (...) Se eu pudesse falar dessa dor, dor que não é simplesmente a ausência de quem se ama, mas uma certeza tristíssima de que daqui por diante, o coração dos homens se tornará mais escuro.... mais, isso é possível ? Ainda mais ? Depois de tudo consumado. Tudo.... depois de consumado o que, Lázaro? Não sei, um sopro de cinza, uma torre derrubada, uma lança, não sei. Depois de tudo consumado, tudo se fará de novo, outra vez, sempre, eternamente. E sendo assim, não será de luz, um dia, o coração dos homens? Não. Mas então, porque ? Por amor, compreendes ? Por amor o sacrifício é sempre renovado, por amor há uma entrega contínua, ainda que sem esperança (...). Depois de tudo, ouve, o amor tomará posse do universo, depois do sacrifício que não sabes ainda, os homens serão cordeiros e a terra será um pasto novo, fecundo e inocente.


(.........)


Lázaro meu filhinho, o Jesus de quem falas está morto há muito tempo, e para os homens de agora nunca ressuscitou, nem está em lugar algum. Não te aborreças mais, sabemos que Ele nunca existiu. Ele foi apenas uma idéia muito louvável (...) essa imagem poderia crescer de tal forma que aplacaria definitivamente a fera dentro do homem. Mas não deu certo. Pelo contrário. (...) Os homens não têm consolo algum, lutam para dar alimento, roupa, e algumas alegrias aos seus filhos e a si próprios. Não há nada além disso. (...) Oh, como havia primavera na minha alma quando o Teu rosto existia sobre o rosto dos homens. Entra na cela, filho, entra! Agora deita-te, assim. (...) olha, Lázaro, nós, os monges, estamos aqui, mas somos o único convento sobre a terra, compreendeste ? O único. E também não acreditamos mais no Cristo, apenas não temos para onde ir, já somos muito velhos... ah ! já sei , olhas o crucifixo na parede, não é ? E estás pensando porque não tiramos os crucifixos das paredes (...)? É muito simples, Lázaro (...): são muitos crucifixos, não temos um depósito para os colocar, entendeste ?

(...)


E agora, Lázaro, não se ouve mais o nome de Jesus, e o símbolo da cruz é símbolo de ameaça. Estas dormindo, Lázaro ? Dorme, dorme. Também vou dormir. O mundo inteiro dorme. E não te aborreças, mas.... além de sabermos que o teu Jesus nunca existiu, sabemos também que Deus ... Oh, oh sabemos.... Deus, Lázaro, Deus agora a grande massa informe, a grande massa movediça, a grande massa sem lucidez. Dorme bem, filhinho.

Lázaro grita. Um grito avassalador. Um rugido. Arregala os olhos e vê Marta. Ela está de pé, junto à cama. As duas mãos sobre a boca.

sábado, 24 de outubro de 2009



Goi, goi, pai coração de boi, pão pão Joana de Ruão, goi, goi, o pai não sabe o que de dentro de mim é, eu sou três, perfeito querubim (...), eu sou criança de muito entendimento, de muita verdade, de muita poesia (...) o que vale é a poesia e não tratados, o que vale é a planície doirada, o vale cor de beterraba, o que vale é o três dentro de mim, noiteaurora, pombamora, branco e vermelho dentro de mim, pai tristeza que não me quer querubim (...) goi, goi, alecrim, goi goi espigão, goi goi roseiralmirim. (...)
Amor feito de vísceras , de matérias várias, de mel, amo tudo o que pode ser, amo o que é, amodeio tudo o que pode e é. Louvado seja esse bem-estar de assim ser, louvado seja o meu dorso estriado, minhas misérias, glórias de outro, a expectativa de vinganças, abrindo o poço para que eu desapareça, coisa muito a seu gosto, com a clarabóia escancarada para que eu resolva voar, para que eu resolva assumir o ser da cigarra, saindo pela clarabóia e morrendo depois transparência, rigidez acetinada, glória a todos esses que cantam até a morte : glória.
(...)
Ai, goi goi, se é verdade que o amor vincit omnia
(...)
Quero lhes contar do meu ser a três, mas é tão difícil, goi goi, é ser de um jeito inteiriço, cheio de realeza, é ser casto e despudorado, é um ser que vocês só conheceriam num vir a ser, é como explicar à crisálida que ela é casulo agora e depois alvorada, é como explicar o vir a ser de um ser que só se sabe no AGORA, ai, como explicar o DEPOIS de um ser que só se sabe no instante ?

Goi goi, estão vendo que esforço faz a minha lingüinha para dizer dos mistérios ? !

domingo, 18 de outubro de 2009


2- MUDAR O MUNDO

Na conclusão de minha primeira conferência citei que “a concepção humanística considera uma criança (...)” Em outro momento, ele foi além desenvolvendo essa imagem observando que “ o solo e a liberdade requeridos para o crescimento de um homem são incomensuravelmente mais difíceis de se descobrir e se obter. .. e o completo crescimento que pode ser esperado, não pode ser definido ou demonstrado; ele é sutil e complexo, só pode ser sentido através de uma intuição delicada e vagamente apreendido pela imaginação e pelo respeito. (...)

“A educação deveria ser guiada pelo espírito de reverência , por algo sagrado indefinível , ilimitado , algo individual e estranhamente precioso, o princípio crescente da vida, um fragmento encarnado do obstinado esforço do mundo”.

Wilhelm von Humboldt :

toda cultura brota única e imediatamente da vida interior da alma e só pode ser estimulada a partir da natureza humana, e nunca produzida por maquinações externas artificiais.... o que quer que não brote da livre escolha do homem, não penetra em seu Ser mais profundo, mas ainda permanece estranho a sua verdadeira natureza. Nesse caso, o homem não atua movido com energias verdadeiramente humanas, mas apenas com exatidão mecânica”.

Se colocarmos a natureza humana sob essa luz:

“todos os camponeses e artesãos poderiam ser elevados à condição de artistas, ou seja, homens que amam o seu trabalho em si mesmo, o tornam melhor através de seu gênio plástico e de sua habilidade inventiva. Deste modo, eles cultivam o intelecto, enobrecem seu caráter e exaltam e refinam seus prazeres.”

A oposição de Russel à prática educacional coercitiva estava ligada ao seu desejo de uma reconstrução radical da sociedade, “uma eliminação de todas as fontes de opressão, uma liberação das energias construtivas do homem, com um modo totalmente novo de conceber e regular as relações :

“ Em meio aos mitos e às histerias de ódios que se opõem, é difícil fazer a verdade atingir as massas das pessoas, ou mesmo espalhar o hábito de formar opiniões baseadas em evidências e não na paixão. No entanto, em última instância, é nestas coisas, e não em qualquer panacéia política, que as esperanças do mundo devem residir.”

sábado, 17 de outubro de 2009

PROBLEMAS DO CONHECIMENTO E DA LIBERDADE.


NOAM CHOMSKY

Mas a gratidão pode ser compartilhada por todos aqueles que valorizam a razão, a liberdade e a justiça, e que são cativados pela visão de Russell tem do “mundo que todos devemos buscar”:

“um mundo em que o espírito criativo está vivo, no qual a vida é uma aventura cheia de esperança e de alegria, baseada no impulso de construir e não no desejo de reter o que se possui ou de tomar o que outros possuem. Deve ser um mundo em que os afetos tenham livre curso, no qual o amor seja purgado do desejo de dominação e a crueldade e a inveja tenham sido dissipadas pela felicidade e pelo desenvolvimento sem entraves de todos os instintos que erguem a vida e a preenchem com os prazeres da mente.”


1) INTERPRETAR O MUNDO

Ele propôs que os limites do conhecimento humano são determinados pelas regras que limitam as hipóteses admissíveis, que poderiam ser concebidas como bastante restritivas . Trata-se de uma idéia perfeitamente inteligível.

A imagem de uma mente, inicialmente irrestrita, desencadeada livremente em direções arbitrárias, pode sugerir, em princípio , uma visão mais rica e esperançosa da liberdade e da criatividade humanas. Mas acho que essa conclusão está errada. Russel estava certo em intitular seus estudos em “ Human Knowledge : its scope and limits” (O conhecimento humano: seu escopo e limites). Os princípios da mente fornece os escopos e os limites da criatividade humana. Sem esses princípios, a compreensão científica e os atos criativos não seriam possíveis. Se todas as hipóteses são inicialmente equivalentes, então nenhuma compreensão científica pode ser atingida, pois não haverá meios de selecionar, dentro de um vasto arranjo, teorias compatíveis com nossa evidência empírica limitada e, por hipótese, igualmente acessíveis à mente.

Alguém que abandona todas as formas, todas as condições e restrições, e age de maneira aleatória e inteiramente à vontade, com certeza não está engajado em uma criação artística, seja lá o que ele possa estar fazendo. “O espírito da poesia, como todos os poderes vivos, deve necessariamente circunscrever-se a regras”
Coleridge escreveu : “talvez às leis de sua própria origem” Como Russel frequentemente expressava , “ se a verdadeira vida” do homem consiste “ em Arte e Pensamento e Amor, na criação e contemplação do belo e na compreensão científica do mundo” . Se isto é “a verdadeira glória do homem” , então são os princípios intrínsecos da mente que deveriam ser o objeto de nosso espanto e, se possível, das nossas investigações. Ao investigarmos algumas das mais conhecidas realizações da inteligência humana, o uso da linguagem, por exemplo, somos imediatamente tocados pelo caráter criativo delas, pelo caráter de criação livre dentro de um sistema de regras. Russel escreveu que “a concepção humanística considera uma criança como um jardineiro considera uma árvore jovem, isto é, como algo com uma certa natureza intrínseca, que se desenvolverá adquirindo uma forma admirável , uma vez conferido solo apropriado, ar e luz”.
Acho bastante justo dizer que é a concepção humanística do homem que tem avançado e conseguido ganhar substância à medida que descobrimos os ricos sistemas de estruturas , invariantes e princípios subjacentes às realizações humanas mais humildes.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

L'Amour Est un Oiseau Rebelle

L'Amour est un oiseau rebelle

Que nul ne peut apprivoiser

Et c'est bien en vain qu'on l'appelle,

S'il lui convient de refuser.


Rien n'y fait, menace ou prière,

L'un parle bien, l'autre se tait;

Et c'est l'autre que je préfère

Il n'a rien dit; mais il me tient.


L'Amour est un oiseau rebelle

L'Amour

Que nul ne peut apprivoiser

L'Amour

Et c'est bien en vain qu'on l'appelle

L'Amour

S'il lui convient de refuser

L'Amour


L'Amour est enfant de Bohême,

Il n'a jamais, jamais connu de loi,

Si tu ne m'aime pas, je t'aime,

Si je t'aime, prend garde à toi!

(Prends garde à toi)

Si tu ne m'aime pas si tu ne m'aimes pas je t'aime

(Prends garde à toi)

Mais si je t'aime si je t'aime prends garde à toi!


quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Só para raros

Em decorrência da fetidez que assola o país, só tenho vontade de escrever textos sórdidos, coléricos, cínicos, degradantes ou estufados de um humor cruel (...), “censurado”, ou só para cínicos , ou “só para fazer sorrir os desesperados”, ou até quem sabe , à maneira de Hesse: “só para raros”. Porque convenhamos, há pulhas em demasia. E enquanto não se resolve isso (...) não consigo escrever nada de coerente e agradável (...). A cólera pode ser sanada através de um texto escuro e licencioso, mas diante de uma realidade tão acabrunhada (...) me vem um texto de G.R. Urban citando Bérgson: não são somente as palavras que se extenuam, racham e, às vezes, “quebram sob a carga”, mas idéias também sofrem tensão e se desintegram ante a inibidora presença das palavras.

Odes maiores ao pai

imagem
I

(Largo Pensante)

Uns ventos te guardaram. Outros guardaram-me a mim. E aparentemente separados
Guardamo-nos os dois, enquanto os homens no tempo se devoram.
Será lícito guardarmo-nos assim?
Pai, este é um tempo de espera. Ouço que é preciso esperar
Uns nítidos dragões de primavera, mas à minha porta eles viveram sempre,
Claros gigantes, líquida semente no meu pouco de terra.
Este é um tempo de silêncio. Tocam-te apenas. E no gesto
Te empobrecem de afeto. No gesto te consomem.

Tocaram-te nas tardes, assim como tocaste
Adolescente, a superfície parada de umas águas? Tens ainda nas mãos
A pequena raiz, a fibra delicada que a si se construía em solidão?
Pai, assim somos tocados sempre.
Este é um tempo de cegueira. Os homens não se vêem. Sob as vestes
Um suor invisível toma corpo e na morte nosso corpo de medo
É que florece.

Mortos nos vemos. Mortos amamos. E de olhos fechados
Uns espaços de luz rompem a treva. Meu pai: Este é um tempo de treva.

II

Ah, essas dores! E o voltar contínuo ao silêncio das tardes!
Junto ao muro dos mortos o passeio se fazia longo. Estacávamos.
A tarde embobrecia de luz. O tempo galopava.
Vês? Tenho a alma pesada. Uma avidez no olhar
Antes ingênua, agora se fez grave. Há naquele campo a imutável paisagem:
As papoulas abertas, as ruas estreitas e uma grande e única alameda.
E datas, retratos. E súbito o ocre da terra sob os passos.
A mulher caminhava. Comprimia no peito a sua flor e de humildade
Era o olhar à procura do nome. Se tu visses depois que luminosa altivez
Se insinuava, quando voltava leve, sem o peso das dádivas.
E muitas passaram vagarosas. Umas lunares, com seus rostos aduncos.
Outras com as centelhas escondida dos sacrários.


III

Não é teu este canto porque as palavras se abriram sobre a mesa.
Se chegavas era em silêncio e tocavas as coisas
Com a leveza dos meninos arminando os altares. Uma rosa tardia
Mesmo assim desmanchava-se e tua presença na noite eu procurava.
Ninguém jamais nos via quando nos falávamos. As perguntas de sempre,
Os castiçais, o adro vazio da capela em frente. E as persianas fechadas,
Para que sal de fora não pousasse
Nas baixelas incríveis da memória. Aquele mar repetindo seu canto
E as vozes partindo teus cristais! Como te abrigavas do ruído das estradas
E os teus livros abertos, como se desfizeram naquelas areias!
Nem sei de onde me vêm estes musgos, açoites, esta fonte que é nova
Em minha boca. Nem sei dizer da morte o que te ouvi dizer nos ecos de umas noites.

Enquanto te celebro, as janelas do ocaso trazem risos.
E um hóspede atravessou incógnito teu jardim, afundou-se na nevoa
Cansou-se do teu hálito nas arestas, nas muradas, nos cálices, em mim
És presente como um vento que corre entre portas abertas.


IV

Na tua ausência, na casa o perfume das igrejas. O odor
Da castidade antiga dos incensos, reacendeu a alegria da infância
E aspirei contigo o perfume menos casto das cerejas. Na casa,
Um ruído de contas de rosário, mas eu só, meu pai, te vigiava.
Os ventos te seguiram. E próxima do teu passo, eu mesma era silêncio
A pedra. Impossível de abraço.
Uma torre contigo caminhava. Nos muros, nas escadas, refizeram ardis
Fibras trançadas, e aqueles pareciam mais largos, aquelas mais altas.
No teu andar, um quase nada definido. Tinhas o caminhar dos animais.
Espaçado e perdido. Respirei teu mundo movediço: Pai, não viste o sal da terra
Corroendo os pilares, as cruzes, as capelas ? E o sonho sobre a tua fonte
E mesmo uma crisálida pronta para ter asas ?
Abriram-se os portões, mas a casa era nova. A que foi nossa.
Tuas filhas te disseram que na noite, um homem e sua torre,
Com paciência guardadas, pouco a pouco a demoliram.


V

Sobrevivi à morte sucessiva das coisas do teu quarto.
Vi pela primeira vez a inútil simetria dos tapetes e o azul diluído
Azul-branco das paredes. E uma fissura de um verde anoitecido
Na moldura de prata. E nela o meu retrato adolescente e gasto.
E as gavetas fechadas. Dentro delas aquele todo silencioso e raro
Como um barco de asas. Que fome de tocar-te nos papéis antigos!
Que amor se fez em mim, multiforme e calado!
Que faces infinitas eu amei para guardar teu rosto primitivo!
Desce da noite um torpor singular, água sob o casco de um velho veleiro
Calcinado. Em mim, o grande limbo de lamento, de dor, e o medo de esquecer-te
De soltar estas âncoras e depois florir sem ao menos guardar tua ressonância.
Abraça-me. Um quase nada de luz pousou na tua mesa
E expandiu-se na cor como um pequeno prisma.

VI

Há tanto a te dizer agora! Meus olhos se gastaram
Procurando a palavra nas figuras, nos textos, nas estórias.
Era preciso viajar e levantada em renúncias redescobrir a morte
Além de seu sudário e suas tremuras. Quase nada aprendi.
De nada me lembrei.
Há talvez a memória de tatos, um sentir rarefeito, um ouvido inexato
Deitado em solidão sobre o teu peito. E adeuses ingênuos, calados de vitória
E aquele de fereza, de acerto, dissolvido em orgulho, ressuscitado
Vagamente em canto. E na manhã, o meu sonho passara e a minha voz
Não se erguera em poesia.

Será preciso esquecer o contorno de umas formas que vi: naves, portais
E o grande crisântemo sobre a faixa restrita do canteiro.
Através do gradil, no terraço do tempo te percebo.

E ainda que as janelas se fechem, meu pai, é certo que amanhece.
(publicado junto à crônica acima em Cascos & Carícias & outras crônicas , 1993)

sábado, 29 de agosto de 2009

Senhora

Los rios, las cadenas, la cárcel de si mesma (...)

desconheces quase toda tua totalidade, que contornos havia aos quinze anos aos vinte, lá dentro do ventre, que águas, plasma e sangue, que rio te contornava? Que geografia se desenhava no teu rosto, e o rosto daquela que te carregava na barriga, como era ? como te carregava essa que habitavas? Como eras antes que o amor surgisse entre aquelas duas almas, pai-mãe, quando ele era jovem e se perguntava que mulher se deitaria sob seu grande corpo, que fúria de palavras lhe viria à boca, amada, loca, luz que caminhou baça sob as águas, então eras tu? Sabes, às vezes penso que deves ter um homem jovem porque

sim

porque sabes muitas coisas, essas da alma, e um saber demasiado
oscurece el alma
isso mesmo, e porisso talvez alguém de vinte, vinte e cinco, meio diminuído, sensualão
Rimbaud tinha dezenove quando escreveu aquilo é, mas é raro, moçoilos são fracotes no UMM, e então continuando,

um de vinte, vinte e cinco talvez,
duro e vigoroso, um que não sucumba diante do
mosaico intumescido de cores vivas onde desenhas a vida, e num canto lá em cima desse grande mosaico um negrume de vísceras , um desespero só teu, esse negrume teu

que busca

es que busco La Cara, La Oscura Cara
bobagem. então continuando, esse muito jovem há de sorrir diante do teu discurso , te põe de imediato a mão nas tetas e diz teu Deus sou eu, (...), já me encontraste, e se ainda continuares com tuas pretensas justas palavras e tua cara de pedra quando falas na busca, esse muito jovem há de te mostrar já sei. uma bela caceta
isso. e delicado mas firme te faz abrir as pernas e

repete

sei. teu Deus sou eu.
acertaste.(...)
então sabes. escolhe alguém que não te leve a sério, porque
el alma de (...) se oscurece por lo mucho que sabe (...) se eras homem sabias desse turvo no peito, desse grande desconhecimento que de tão grande se parece a sabedoria, de estar presente no mundo sabendo que há um pai eternamente ausente.

(...) teu pai está morrendo, te chama

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Cego caminharei sobre granitos de fogo
Descarnado e demente para todos
Mas trovador de trinados
Do negro paraíso do teu rosto
Ou se quiseres, dobra-me.
Tua mão sobre a minha nuca
há de curvar o meu corpo até a cintura
Nos tonéis da pergunta. Hei de saber o fosso
Do nunca compreender. Como tem sido até agora
Sobre mim, esses ventos de areia do teu sopro
Ou aquieta-me. O coração junto ao musgo da pedra
Isento desta busca.

Com os meus olhos de cão

O fruto verde foi arrancado? Ele disse isso? O muro do outro lado da rua. Há certos muros que não devem ser vistos antes de envelhecermos: musgo e ocre, dálias sobre alguns, dilaceradas, sons que não devem ser ouvidos, pulsações da mentira, os metálicos sons da crueldade ecoando fundo até o coração, palavras que não devem ser pronunciadas, as eloqüentes-ocas, as vibrantes de infâmia, as rubras de sabedoria, latejantes. Sustos. Como me sinto? Como se colocassem dois olhos sobre a mesa e dissessem a mim, a mim que sou cego: isto é aquilo que vê. Esta é a matéria que vê. Toco os dois olhos em cima da mesa. Lisos, tépidos ainda (arrancaram há pouco), gelatinosos. Mas não vejo o ver. Assim é o que sinto tentando materializar na narrativa a convulsão do meu espírito. E desbocado e cruel, manchado de tintas, essas pardas-escuras do não saber dizer, tento amputado conhecer o passo, cego conhecer a luz, ausente de braços tento te abraçar (...)

Daqui onde estou posso ouvi-lo pensando da lucidez de um instante à opacidade de infinitos dias, posso ouvi-lo pensando nas diversas formas de loucura e suicídio. A loucura da Busca, essa feita de círculos concêntricos e nunca chegando ao centro, a ilusão encarnada ofuscante de encontrar e compreender. A loucura da recusa, de um dizer tudo bem, estamos aqui e isto não basta, recusamo-nos a compreender. A loucura da paixão, o desordenado aparentando ser luz na carne, o caos sabendo à delícia, a idiotia simulando afinidades. A loucura do trabalho e do possuir. A loucura do aprofundar-se depois olhar à volta e ver o mundo mergulhado em matança e vaidade, estar absolutamente sozinho no mais profundo.
Daqui onde estou posso ouvi-lo pensando como devo matar-me? Ou como devo matar em mim as diversas formas de loucura e ser ao mesmo tempo compassivo e lúcido, criativo e paciente, e sobreviver? Como pode viver o velho amor em mim se compreendi o instante do Amor e agora pertenço ao mundo dos mudos e a garganta ancha de vazios?

domingo, 16 de agosto de 2009

"Vita brevis, sensus ebes, negligentiae torpor et inutiles, ocupationes nos paucula scire permittent. Et aliquotients scita excutit ab animo per temporum lapsum frudatix scientiae et inimica memoriae praeceps oblivio". (Nicolau Copernico)

" (...) je saisis en sombrant que la seule verité de l´homme, enfim entrevue, est d´être une supplication sans réponse." (Georges Bataille)

sábado, 15 de agosto de 2009

SECO ESTUDO DE CAVALOS




DESPOJAMENTO

O cavalo é nu.

FALSA DOMESTICAÇÃO

O que é cavalo ? É liberdade tão indomável que se torna inútil aprisiona-lo para que s irva ao homem: deixa-se domesticar mas com um simples movimento de safanão rebelde de cabeça – sacudindo a crina como a uma solta cabeleira- mostra que sua íntima natureza é sempre bravia e límpida e livre.

FORMA

A forma do cavalo representa o que há de melhor no ser humano. Tenho um cavalo dentro de mim que raramente se exprime. Mas quando vejo outro cavalo então o meu se expressa. Sua forma fala.

DOÇURA

O que faz o cavalo ser de brilhante cetim? A doçura de quem assumiu a vida e seu arco-íris. Essa doçura se objetiva no pelo macio que deixa adivinhar os elásticos músculos ágeis e controlados.

OS OLHOS DO CAVALO

Vi uma vez um cavalo cego: a natureza errara. Era doloroso senti-lo inquieto, atento ao menor rumor provocado pela brisa nas ervas, com os nervos prestes a se eriçarem num arrepio que lhe percorria o corpo alerta. O que é que um cavalo vê a tal ponto que não ver o seu semelhante o torna perdido como de si próprio ? É que – quando enxerga – vê fora de si o que está dentro de si. É um animal que se expressa pela forma. Quando vê montanhas, relvas,gente, céu- domina homens e a própria natureza.

SENSIBILIDADE

Todo cavalo é selvagem e arisco quando mãos inseguras o tocam.

ELE E EU

Tentando pôr em frases a minha mais oculta e sutil sensação- e desobedecendo à minha necessidade exigente de veracidade- eu diria : se pudesse ter escolhido queria ter nascido cavalo. Mas- quem sabe- talvez o cavalo ele-mesmo não sinta o grande símbolo da vida livre que nós sentimos nele. (...) O melhor cavalo o ser humano já tem? Então abdico de ser um cavalo e com glória passo para a minha humanidade. O cavalo me indica o que sou.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Sim, estou apaixonado por Macabéa, a minha querida Maca, apaixonado pela sua feiúra e anonimato total pois ela não é para ninguém. Apaixonado por seus pulmões frágeis, a magricela. Quisera eu tanto que ela abrisse a boca e dissesse:

-Eu sou sozinha no mundo e não acredito em ninguém, todos mentem, às vezes até na hora do amor, eu não acho que um ser fale com o outro, a verdade só me vem quando estou sozinha.

Maca, porém, jamais disse frases, em primeiro lugar por ser de parca palavra. E acontece que não tinha consciência de si e não reclamava nada, até pensava que era feliz. Não se tratava de uma idiota mas tinha a felicidade pura dos idiotas. E também não prestava atenção em si mesma : ela não sabia. (Vejo que tentarei dar a Maca uma situação minha : eu preciso de algumas horas de solidão por dia senão “me muero”).
(...)
Silêncio.

Se um dia Deus vier à terra haverá silêncio grande.
O final foi bastante grandiloquente para a nossa necessidade ? Morrendo ela virou ar. Ar enérgico? Não sei. (...) No fundo ela não passa de uma caixinha de música desafinada.
Eu vos pergunto:

- Qual é o peso da luz?

E agora (...) Meu Deus, só agora me lembrei que a gente morre. Mas- mas eu também?!
Não esquecer que por enquanto é tempo de morangos.
SIM.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

A viagem

Impossível explicar. Afastava-se aos poucos daquela zona onde as coisas têm forma fixa e arestas, onde tudo tem um nome sólido e imutável (...)
De profundis? Alguma coisa queria falar... De profundis... Ouvir-se! prender a fugaz oportunidade que dançava com os pés leves à beira do abismo. De profundis. Fechar as portas da consciência. (...) De profundis. Vejo um sonho que tive : palco escuro, abandonado atrás de uma escada. Mas no momento em que penso : "palco escuro" em palavras , o sonho se esgota e fica o casulo vazio. (...)
De profundis. Deus meu eu vos espero, deus vinde a mim, deus, brotai no meu peito, eu não sou nada e a desgraça cai sobre a minha cabeça e eu só sei usar palavras e as palavras são mentirosas e eu continuo a sofrer, afinal o fio sobre a parede escura.(...) deus vinde a mim , eu não sou nada eu sou menos que o pó e eu te espero todos os dias e todas as noites, ajudai-me, eu só tenho uma vida e essa vida escorre pelos meus dedos e encaminha-se para a morte serenamente e eu nada posso fazer e apenas assisto ao meu esgotamento a cada minuto que passa, sou só no mundo, quem me quer não me conhece me teme e eu sou pequena e pobre (...)

O que nela se elevava não era a coragem, ela era substância apenas (...) ela existia e o que havia dentro dela eram movimentos erguendo-a sempre em transição. Talvez tivesse alguma vez modificado com sua força selvagem o ar ao seu redor e ninguém nunca o perceberia, talvez tivesse inventado com sua respiração uma nova matéria e não o sabia (...) um dia virá em que todo o movimento será criação, nascimento, eu romperei todos os nãos que existem dentro de mim, provarei a mim mesma que nada há a temer, que tudo o que eu for será sempre onde haja uma mulher com meu princípio, erguerei dentro de mim o que sou um dia, a um gesto meu minhas vagas se levantarão poderosas, água pura submergindo a dúvida, eu serei forte como a alma de um animal (...) não haverá espaço dentro de mim para notar sequer que estarei criando instante por instante (...) serei brutal e malfeita como uma pedra, serei leve e vaga como o que se sente e não entende, me ultrapassarei em ondas, ah, Deus e que tudo venha e caia sobre mim, até a incompreensão de mim mesma em certos momentos brancos porque basta me cumprir e então nada impedirá o meu caminho até a morte-sem-medo, de qualquer luta ou descanso me levantarei forte e bela como um cavalo novo.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

“ das profundezas chamo por vós... das profundezas chamo por vós. Permaneceu ainda uns instantes parada, o rosto sem expressão, lasso e cansado como se ela tivesse tido um filho. Aos poucos foi renascendo (...) frágil, respirando de leve (...) então começou a pensar que na verdade rezara. Ela não. Alguma coisa mais do que ela, de que já não tinha consciência, rezara. Mas não queria orar, repetiu-se mais uma vez, francamente. Não queria porque sabia que esse seria o remédio. Mas um remédio como a morfina que amortece qualquer tipo de dor. Como a morfina, que se precisa cada vez mais de maiores doses para senti-la. Não, ainda não estava tão esgotada que desejasse covardemente rezar em vez de descobrir a dor, de sofrê-la, de possuí-la integralmente para conhecer todos os seus mistérios. E mesmo que rezasse, terminaria num convento, porque para a sua fome quase toda a morfina seria pouca.. E isto seria a degradação final, o vício.”

terça-feira, 30 de junho de 2009

O Inverno



Um tremor gelado traz a neve invernal

Ao severo soprar do hórrido vento,

Corre-se, batendo-se os pés a todo momento;

E pelo excessivo frio batem-se os dentes.



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Concerto para Violino e Orquestra, Opus 8, nº4.

domingo, 7 de junho de 2009

Hon Sha Ze Sho Nen


A você:

A paz profunda (...) da Onda Sutil
A paz profunda (...) do Ar envolvente
A paz profunda (...) da Terra Silenciosa
A paz profunda (...) das Estrelas Brilhantes
A paz profunda (...) do FILHO DA PAZ.



quarta-feira, 13 de maio de 2009

Canto XXXIII- Paraíso

(Com carinho para Maria Borges)

A Rosa Mística

1- “ Ó Virgem Mãe, filha do Filho teu,
humilde e mais sublime criatura,
pedra angular do desígnio do Céu;

4- tu foste aquela que humana Natura
assim enobreceu, que o seu Feitor
não desdenhou de assumir sua figura.

7- Reacende no ventre teu o Amor,
por cujo o alento, na eterna bonança,
germinou aqui esta divina Flor.

10- Raio és aqui que um Sol merídio lança
de caridade e , entre os mortais, na Terra,
és a perene fonte da esperança.

(...)

19- Em ti misericórdia, em ti piedade,
em ti grandeza; é em ti que se consuma
quanto haja uma criatura de bondade.

22- Ora est(a) que da ínfima pra suma
situação do Universo olhando vem
vidas espirituais, de uma em uma,

25- A Graça pede a ti de que também
a virtude dos olhos seus levantes,
por subir a visão do Sumo Bem.

28- E eu que por minha vista nunca antes,
que ora por sua, mais ardi, toda prece
te oferto, e espero que sejam bastantes

31- pra que da névoa ele se desempece
da humanidade sua, tão que de Deus
tenha a visão que a tua Graça oferece.

34- E mais, Rainha que os desejos teus
podes querer, rogo que guardes sãos,
após tanta visão, os afetos seus.

37- Vença a tua guarda os humanos desvãos;
vê, por minha oração, quantos beatos
à volta de Beatriz juntam as mãos.”

(...)

64- Assim, ao Sol a neve se destila;
assim ao vento, em suas folhas volantes,
se perdiam as respostas da Sibila.

67- Ó Suma Luz que tanto, dos errantes
mortais, te elevas, ora à minha mente
um pouco reapareças como dantes,

70- e faças minha língua tão potente
que uma centelha apenas de tua glória
possa deixar para futura gente;

(...)

82- Ó Farta Graça, por quem incidir
ousei os olhos meus na Luz Eterna,
tão fundo até nela me consumir!

(...)

124- Ó eterna Luz que repousas só em Ti;
a Ti só entendes e, por Ti entendida,
respondes ao amor que te sorri!

(...)

139- Mas não tinha o meu vôo um tal poder;
até que minha mente foi ferida
por um fulgor que cumpriu Seu querer.

142- À fantasia foi-me a intenção vencida;
mas já a minha ânsia, e a vontade, volvê-las
fazia, qual roda igualmente movida,

145- o Amor que move o Sol e as mais estrelas.

domingo, 10 de maio de 2009

Canto XX- Paraíso

88- "Vejo bem", disse, "que essas coisas crês,
saber como, porque as digo eu,
que, acreditando, ocultas inda as vês.

91- Tu fazes como aquele que aprendeu
da coisa o nome, mas não sua essência,
que ele não vê se alguém não lhe alça o véu.

94- REGNUM COELORUM suporta a violência
se de tanta esperança ardente for
que até vença a divina Providência;

97- não como homem de homem agressor,
mas a vence porque Ela ser vencida
deseja, e vence com o seu amor.

(...)

133- E vós mortais, freai vossos conceitos,
ao sentenciar, que inda nós, que Deus vemos,
não conhecemos todos os eleitos;

136- dessa falta contentes nos fizemos,
pois nosso bem nesse bem se refina,
que aquilo que Deus quer é o que queremos".

domingo, 26 de abril de 2009

Canto XII- Paraíso

88- E à Sé que, larga com seus pobres, tinha
sido e ora já (não por ela, direi,
mas pelo que lá senta) se amesquinha,

91-não 'dois ou três cada seis', nem da lei
primeiro o benefício então vacante,
nem 'decimas quae sunt pauperum Dei'

(...)

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Canto I-Paraíso

(Ascenção)
1- A glória do Senhor, que tudo move,
no Universo difunde-se e esplandece
onde mais, onde menos se comprove.

4- No Céu que mais a sua luz favorece
estive, e coisas vi que redizer
nem sabe ou pode quem de loa ora desce;

7- Porque, se aproximando ao seu querer,
a nossa mente se aprofunda tanto,
que a faz de sua memória se perder.

10- Porém, tudo do que, do reino santo,
pode o intelecto seu fazer tesouro,
ora será matéria do meu canto.

(...)

70- Transumanar não pode-se entender
por palavras, portanto o exemplo baste
para quem experencia a Graça conceder.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Alto Purgatório: o amor excessivo

(A gula)

Canto XXIII
10- E eis que planger ouvimos e cantar
"Labia mea Domine" , agora não só
mágoa, mas júbilo a comunicar.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

IX Círculo do Inferno

(da fraude complexa)

Canto XXXI

67 - “Raphael may amech zabi almi”,
começou a gritar a fera boca,
que doce salmo não daria de si.

70- E pra ele o meu guia : “ Ó alma oca,
cata essa trompa que te desafoga
quando ira ou paixão outra te toca:

75- encontrarás no teu pescoço a soga
que a amarra, e a acharás, alma confusa,
sobre o teu peito onde pendendo joga”.